quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Hoje a Europa, Hoje Portugal

Hoje a Europa

A Europa agoniza na sala dos fundos de um hospital de terceiro mundo. Ninguém repara muito nela, nem se debruça o suficiente sobre o caso clínico a ponto de lhe encontrar uma cura. Ninguém parece, portanto, muito preocupado com a sua recuperação, rápida ou lenta. Dos seus diversos membros um está em fase de colapso, enquanto outros estão a aproximar-se rapidamente deste ponto demasiado crítico. Os dias que se vivem na Europa de hoje são terrivelmente perturbantes para quem se habituou a viver num clima de paz e prosperidade e, de repente, sente que todas as conquistas dadas como adquiridas se tornaram num turbilhão de vulnerabilidades. A preocupação com as dívidas externas dos Estados europeus e dos privados sobrepôs-se de forma absolutamente inadmissível à consolidação de uma forma verdadeiramente unificada de cidadania europeia. Da Europa dos Estados e dos cidadãos passou-se à Europa das constantes cimeiras franco-alemãs. Da Europa das decisões colectivas transitou-se para uma outra realidade de domínio individualista de dois Estados cujos Governos, de direita conservadora, se encontram rendidos ao mercado e à sua capacidade de auto-regulação, que mais não significa do que uma tentativa desesperada de proteger os seus próprios sistemas financeiros. Eu acredito num projecto de uma Europa Federalista, num projecto arrojado de uma verdadeira unificação do que pode e deve ser unificado, mas onde sejam asseguradas as diversidades culturais. Onde cada Estado passe a ser verdadeiramente um membro de uma entidade maior.

Hoje Portugal

 Por cá, entre as notícias que vão chegando da Grécia e de Cannes, onde parece que os hotéis de luxo se encontram cheios de chefes de Estado e de Governo, a classe política discute o mais duro Orçamento de Estado (OE) de que há memória, mas simultaneamente o mais injusto e o mais letal. Apesar disso e depois de no início desta semana terem surgido notícias de que o anterior secretário-geral do PS teria influenciado alguns deputados a votarem contra ao orçamento, parece que a opção da actual liderança será a abstenção. Abstermo-nos é não tomarmos posição nenhuma. É querer ficar bem com Deus e como Diabo. É não assumir que este OE não seria nunca resultado de um Governo socialista. É certo que há compromissos com a troika e que esses compromissos foram, em primeira mão, negociados pelo PS. Mas este OE vai muito além do que a imaginação daquele triunvirato poderia alcançar. O PS não é peça crucial neste processo. O OE passará com ou sem os votos dos deputados socialistas. Por isso, é meu entendimento que só depois de uma negociação séria com o Governo, de que resulte a subtracção ao OE de um conjunto de medidas fortemente penalizadoras quer do comum dos cidadãos, quer das pequenas e médias empresas, o PS poderá tomar uma posição pela abstenção. Caso contrário deveria ser atribuída a liberdade de voto aos deputados socialistas para cada um se expressar com base na sua consciência.
Nos termos em que o texto do OE se encontra e atendendo ao papel de partido subalterno a que o Governo remeteu o PS, eu votaria contra!


Rui Estevão Alexandre in revista Sabado 3 de Novembro de 2011

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